quinta-feira, 27 de dezembro de 2012



                    O CANTO DOS POETAS



     Tenho estado a publicar no meu blogue decaedela impressões da viagem que fiz recentemente à China. Achei que este pequeno artigo sobre a poesia chinesa clássica constituiria um bom encerramento do ano para a página digital de O CANTO DOS POETAS.
     Aproveito para desejar a todos os associados um ano muito melhor do que o indicado pelas previsões.
                                                                            António Trabulo

   GRANDES POETAS CHINESES


Os quatro grandes poetas chineses que vou referir nasceram todos no século VII DC. Trata-se claramente da época de oiro da poesia chinesa. Ainda hoje se lêem com agrado. Espanta a modernidade de poemas escritos há cerca de treze séculos, bem antes dos alvores da nossa nacionalidade. Testemunharam a História e permanecem. Ilustram a perenidade das emoções humanas. Constituem, de algum modo, espelhos do que somos. No carinho e no desafeto, no amor e no ódio, na alegria, na tristeza e no devaneio, não estaremos muito longe dos sentimentos dos homens de épocas passadas e de terras distantes.
A poesia chinesa clássica difere da nossa na escolha dos temas. Não trata do épico nem do dramático. Os poemas são geralmente curtos e integram-se na harmonia confuciana do mundo. Curiosamente, cantam as montanhas, os rios, os lagos e as bailarinas, mas raramente se ocupam do mar.

                          LI BAI



Li Bai (701-762) é considerado um dos maiores poetas na China, a par de Du Fu. Foi contemporâneo de Wang Wei (nasceram ambos no mesmo ano). Boémio, vagabundo, repentista, levou uma vida agitada. Diz a lenda que morreu afogado no Rio Azul quando, embriagado, procurava agarrar a imagem da lua refletida na água.


                                PENSAMENTOS NOTURNOS

         Diante da cama,
         brilha o luar,
         que mais parece
         gelo no chão.

         Se levanto a cabeça,
         contemplo a lua.
         Ao baixá-la
         sonho com a terra natal.


           NO TERRAÇO DE SU VEJO O PASSADO

Velhos jardins, um terraço em ruínas, salgueiros novos;
─ Os que colhem o tríbulo, o claro som das canções, a primavera insuportável
E agora somente a lua no rio, a oeste
Ela, que uma vez brilhou no rosto de uma dama, no palácio do rei de Wu

 (A dama do poema é Xi Shi, uma das mulheres mais belas da China. O rei apaixonou-se por ela e descurou a governação.  Acabou por perder o reino).



                 WANG WEI



 Wang Wei (701-761) foi poeta, músico e pintor. Pertencia a uma família de mandarins e foi mandarim também. Mandarins eram os letrados que se ocupavam da administração da imensa China. A língua escrita era apenas acessível a essa elite de funcionários públicos que governou a China até à era moderna.
Os candidatos a mandarim aprendiam a pintar a língua escrita e seguiam os ensinamentos de Confúcio. A carreira prosseguia através dum filtro de exames públicos nacionais em que eram selecionados os de maior valor. Foram, durante séculos a fio, esteios dos impérios.
Quase todas as vidas têm altos e baixos. Os pontos elevados da carreira de Wang Wei  fizeram-no sentar à direita do Imperador, como conselheiro influente do Secretariado Imperial. Nas fases baixas, desempenhou funções menores em regiões distantes, mas foi quase sempre um mandarim influente e rico.



PARTINDO DE MADRUGADA PARA O DESFILADEIRO DE BA

               De madrugada, com restos de primavera,
               deixo a capital, rumo ao desfiladeiro de Ba.
               Uma mulher lava roupa nas águas límpidas do rio,
               os pássaros chilreiam ao sol da manhã.
               Sobre as águas, faz-se o comércio nos barcos,
               há pontes suspensas do topo das árvores.
               Subo a um monte, emergem cem aldeias,
               lá longe, dois rios brilham como prata.
               As pessoas falam estranhos dialetos,
               mas os pintassilgos cantam como na minha terra.
               Sou capaz de reconhecer a paisagem,
               minha tristeza se atenua.



                                    NOSTALGIA

                Moro na foz do rio Meng,
                a porta da casa diante das águas,
                do sul, os barcos sempre a chegar,
                quando trazem uma carta para mim?

                Vens da minha aldeia natal
                informado, com certeza, de mil coisas.
                Quando partiste, em frente da sua janela,
                desabrochavam já flores de ameixieira?

                As árvores cobertas de pétalas,
                as aves de novo a cantar.
                Reverdecem os campos, desassossego em mim,
                receio ver crescer a erva, diante da cancela. 


                      DU FU 


Não existem retratos autênticos de Du Fu. Esta pintura é imaginada por um pintor que viveu mais tarde.

Mais que os taoistas Li Bai e Bai Juyi e o budista Wang Wei, o confucionista Du Fu (712-770) impôs-se como o vulto maior da poesia chinesa.
Pouco alcançou na vida, ao contrário dos grandes poetas do seu século de ouro. O seu valor apenas foi reconhecido centenas de anos após a sua morte e muitos (provavelmente dois terços) dos seus poemas perderam-se.
Du Fu descendia de uma família de letrados. O seu avô Du Shenyan foi um poeta importante. Du Fu tentou seguir a carreira de mandarim na administração chinesa, mas reprovou por duas vezes nos exames imperiais. Em 744 conheceu Li Bai, dando início a uma das amizades entre poetas mais famosas no mundo.
Chamam-lhe “o poeta historiador” e “o poeta sábio”. Deixou testemunhos realistas dos tempos atribulados em que viveu.
A sua vida, como a de todo o país, foi devastada pela rebelião do general An Lushan que  rebentou em 755, quando Du Fu contava 43 anos. A guerra civil que se lhe seguiu terá provocado perto de doze milhões de mortos.
      Os últimos anos da vida do poeta decorreram em sobressalto quase constante, a meio de dificuldades económicas. Morreu durante a longa viagem que empreendeu pelo rio Yangtze, tentando regressar a Changan. 


OLHANDO A PRIMAVERA

O país em ruínas,
rios e colinas permanecem.
Cidades na primavera,
árvores e folhas renascem.

Tempos assim
tiram lágrimas das flores;
separado do seu par
treme o coração da ave. 

Os fogos da guerra
já juntaram três luas.
As novas de casa
valem agora uma fortuna.

Uma velha cabeça, grisalha,
a cada infortúnio, dilacerada.
E o cabelo que rareia
já nem o alfinete o segura. 



PRNSAMENTOS NOTURNOS

Ervas rasteiras, 
brisa suave,
sozinho na noite 
Sob um mastro, ao alto.

As estrelas suspensas
sobre a vasta planície,
a lua ondula
corre o Grande Rio.

Vem das obras, a fama?
O letrado retira-se, velho
e doente - sempre errante -
que sou eu senão uma gaivota
entre céu e terra?


                                   LIBAI E DUFU



                          BAI JUYI



BAI JUYI (772-846) é o mais popular dos grandes poetas chineses e é também o meu favorito. Filho e neto de pequenos mandarins de província, aprendeu muito cedo a escrever. Viveu tempos agitados, com insegurança, desordens e revoltas. O poeta descreve assim a sua juventude:

Tempos difíceis, anos de fome, perdidos os nossos bens, irmãos, estamos dispersos a leste e oeste.

Aprovado nos exames imperiais, obteve o estatuto de mandarim. Preocupou-se sempre com as condições de vida dos camponeses e escreveu uma série de poemas pedagógicos, com intenção moralizadora. A sua vida pública decorreu com altos e baixos. Ocupou alguns dos cargos mais importantes do país, mas também conheceu o exílio. No governo de algumas cidades importantes, seguiu os princípios taoistas: atuar sem agir, agir sem atuar; o governador pouco ordena; todos lhe obedecem e nada fica por fazer.




        TRANQULIDADE

O homem feliz vê voar os seus dias,
O homem triste arrasta os anos, como o caracol.
Quem ignora vicissitudes, alegrias
Olha, por igual o viajar da lua e do sol.




    APÓS LER POEMAS DE LI BAI E DU FU

Li Bai, letrado da corte vagabundeando a sul do rio,
Du Fu, pequeno mandarim perdido por terras de Sichuan,
ambos toda a vida sem ocupar um posto importante,
permanentemente envoltos pelos horrores da guerra,
desditosos poetas vagueando pelo mundo,
condenados ao exílio no entardecer da vida.
Seus versos, suas canções, estender-se-ão por mil gerações,
a aura de seus nomes pelos quatro cantos da terra.
A humanidade quer, ama a grande poesia,
tal é, por certo, a vontade do céu.




quarta-feira, 14 de novembro de 2012



     A direcção do Núcleo de Poesia de Setúbal dispôs-se, desde que tomou 

posse, a apostar na renovação.  O nosso blogue congratula-se por publicar 

hoje a primeira colaboração juvenil. A Ana tem agora 16 anos e é neta do 

Henrique Mateus.

      Como se vê pelo texto dorido, tem asas para voar alto.



                                           AQUELE  DIA            

  
Já passou muito tempo desde aquele dia.
Não sei se algo se alterou no mundo, se as ações da PT renderam mais que o habitual, se a divida da Grécia aumentou, ou mesmo se algum povo se manifestou contra o governo do seu país. Sei, porém, o que mudou no meu mundo.
Já passou muito tempo desde aquele dia e ainda hoje consigo sentir o que senti. Porque foi, até à data, o dia mais triste da minha vida. Faltavam uns minutos para o dia acabar quando o dia acabou para mim; ou melhor, quando acabou para a minha família.
Há mais de dois anos chorei como nunca o fiz em toda a minha (curta) existência. Foi um dia que desbotou o meu mundo; que mudou a perspetiva que eu tinha da vida e me fez refletir sobre o que, de facto, é o mais importante para mim.
Não considero que perdi essa pessoa, pois, no meu coração, continua mais viva que nunca. Não tenho muito a que me agarrar quando a saudade aperta… Sei que as recordações são tudo o que me resta de um convívio de catorze anos.
Dói saber que nunca mais vou poder ter essa pessoa nos meus braços. A vida é insignificante; em segundos leva-nos as pessoas que mais gostamos em troca de nada. De repente desaparecem e não há nada que possamos fazer para o alterar.
Desde aquele dia, uma das casas em que mais fui feliz ficou vazia, tal como parte do meu coração. Não será este o propósito da vida? Irmo-nos esvaziando ao longo dos anos para depois, quando nos tornarmos suficientemente insignificantes, sermos reduzirmos a nada? Nunca mais voltei àquela casa, porque só faz sentido lá ir se estiver lá alguém para me receber.
Nesse dia perdi muita coisa, e só uns meses mais tarde é que percebi que, apesar de tudo, tinha ganho algo. Ganhei uma estrela, a mais brilhante de todo o céu. Mesmo que não a consiga ver todos os dias, sei que estará sempre lá a olhar por todos aqueles que fizeram parte da sua vida.


                                                                                         Ana Cunha
                                                                                       31/10/2012


                                             MÚSICA

        O Núcleo de Poesia não se dedica exclusivamente à poesia popular. Temos publicado contos, crónicas, lendas e opiniões.
      Deixamos aqui um fado-canção de Joaquim Marrafa, com letra e música.


                                    


                                    OS NOSSOS POETAS


                                     A Minha Escolha


                               Setúbal; quero-te bem,
                               Te escolhi por adopção,
                               E trago-te no peito,
                               Bem junto ao coração!

                               De Grândola, natural,
                               Por isso sou grandolense,
                               Mas como setubalense,
                               Me julgo por igual!
                               É neste jardim ideal,
                               Onde o Sado se detém,
                               E para onde vim também,
                               Na casa dos vinte anos,
                               Sem quaisquer desenganos,
                               Setúbal; quero-te bem!

                              Já eras grande outrora,
                              Uma cidade imponente,
                              Mas comparativamente,
                              És mais importante agora.
                              Em cada minuto ou hora,
                              Progrides em expansão,
                              Com industrialização,
                              E comércio que não para,
                              Por seres jóia tão rara,
                              Te escolhi por adopção!

                              Sem me veres crescer,
                              Me acolheste, todavia,
                              Muito ingrato seria,
                              Eu não o reconhecer.
                              Estou te a agradecer,
                              Pelo que me tens feito,
                              Render-te justo preito,
                              Dizer quanto te venero,
                              Teu filho me considero,
                              E que te trago no peito!

                              Nos braços me apertaste,
                              Me renovaste a esperança,
                              Serei digno da confiança,
                              Que em mim depositaste.
                              Nunca me rejeitaste,
                              Nem invocaste razão,
                              E é com toda a gratidão,
                              Que agradeço o empenho,
                              E afirmar que te tenho
                              Bem junto ao coração!

            Luís Francisco Chainho



                                      UMA FLOR NA TUA MÃO

                           Uma flor na tua mão
                           Uma flor na lapela
                           Não há coisa mais bela
                           Não há rosa, sem senão.

                           Rosas, flores, jardins, pardais
                           Suspiros, pios e ais
                           Alegrias, tristezas
                           Crianças, purezas, que mais?

                           Uma flor na tua mão
                           Uma rosa por abrir
                           Só uma rosa em botão

                           Uma flor na tua mão
                           Uma criança a sorrir
                           E um pobre que pede pão.

                                              Maria Dores Amado



                                                                             MISÉRIAS

                                               Sou rico e saudável
                                               Porque tenho casa e pão
                                               E a minha mente é estável,
                                               Sem excesso de ambição.

                                               Visto de roupa barata,
                                               Ando de bicicleta,
                                               Gosto de arroz e batata
                                               E acho a moda uma treta...

                                               Dos vícios escravizantes
                                               Fujo eu a sete pés,
                                               Nada de anabolizantes,
                                               Tabaco, vinho ou cafés.

                                               Gosto muito da leitura,
                                               Mas entre o baixo custo
                                               Há matéria com fartura,
                                               E até sem gastar um tusto...

                                               Na NET há freeware
                                               Melhor que programas caros,
                                               Porque hei-de então eu prover
                                               Os banquetes dos avaros?...

                                               Há aí muita miséria
                                               Cuja perceção é lógica,
                                               Mas também é chaga séria
                                               A pobreza psicológica!

                                                                           Francisco Pratas



                                                              ALMA DE OUTONO


                                                        Alma de outono traz razão
                                                        transmite nobres segredos;
                                                        faz ouvir novo perdão
                                                        na vontade...sem enredos!

                                                       Com árvores desnudadas,
                                                       campos cobertos de folhagem;
                                                       as paisagens envergonhadas
                                                       pelo trepidar da aragem.

                                                       O sol espreita...de sentinela
                                                       as aves, no chilrear!
                                                       Seguem rota por viela,
                                                       vão em bando patrulhar.

                                                      Passam leves, deixam pena
                                                      que cai sobre uma planta;
                                                      esvoaçam com vida amena,
                                                      seu cantar tanto encanta.

                                                      A terra é embalada
                                                      com as águas da cascata;
                                                      de aroma é perfumada
                                                      do belo que dali dilata.

                                                      A Natureza nunca dorme
                                                      ...oculta o soluçar!
                                                     Dá abrigo e mata a fome,
                                                     vai renovando o Criar.

                                                                    Inácio J. M. Lagarto


                                                   SETÚBAL ANTIGA



                           A gravura mostra um dos arcos do aqueduto, já derrubado. Era possível avistar o castelo de Palmela
                           e as traseiras do Convento de Jesus. Desconheço o nome do autor e a data do desenho .



                               FREI AGOSTINHO DA CRUZ


I
SERRA DA ARRÁBIDA

Ao escrever sobre Frei Agostinho da Cruz, forçosamente tenho de escrever sobre a serra da Arrábida, a sua montanha sagrada como a considerava, e principalmente sobre o seu convento, como este surgiu e porque surgiu ali. Não é por acaso que este conjunto de edifícios religiosos se encontra a meio da encosta, nem muito perto, nem muito longe do mar. Certamente que sobre a escolha daquele ponto, teve influencia os frequentes ataques dos piratas magrebinos, independentemente de outros. É um lugar paradisíaco por excelência, de micro clima ameno, vegetação luxuriante e com protecção completa dos ventos, além existir água de nascente suficiente para manter o empreendimento.


O alto da serra também não seria o local indicado, porque desde os primórdios da humanidade que há um certo respeito e admiração pelo alto dos montes por estes estarem mais perto das estrelas e segundo a superstição de aí ser a morada dos Deuses, sempre foi assim e hoje continua a ser a prática de todas as religiões: – Comparar os porquês? A mitologia grega faz referências ao monte do Olimpo o seu local sagrado. A Bíblia também nos fala do monte de Ararat onde encalhou a arca de Noé, assim como o monte do Sião e o Monte do Templo, como nos fala também do Monte das Oliveiras onde Jesus pregou, qualquer destes não distantes da cidade velha de Jerusalém. Aliás, na Bíblia fazem-se muitas referências do género.


Foi aqui segundo consta, que em tempos remotos foi construída a capela de Nossa Senhora da Arrábida.
Também se fala de, no local, ter existido uma Ermida da Memória. Não será que as duas são a mesma coisa?
Não há vestígios conhecidos que sirvam de referência para se poder afirmar que existiram as duas capelas. Parece poder-se afirmar que uma ermida existiu; a época da sua construção não é conhecida, mas quando foi construída é porque nas proximidades residiria muita gente, porque só assim se justificava a sua construção. Sabe-se que no Portinho sempre residiu uma comunidade de pescadores. Também se sabe que no Creiro, houve em tempos mais distantes um núcleo populacional romano, assim como no sítio onde hoje se situa a Torre do Outão, que foi conhecido por promontório de Neptuno, e onde existiu um templo dedicado a esta divindade, cuja estátua em bronze de tamanho normal foi encontrada “e lamentavelmente utilizada na fundição dos canhões da fortaleza “e, também diversos artefactos que no acto dos achados foram distribuídos por alguns nobres coleccionadores. Hoje restam apenas os vestígios arqueológicos que estão lá e largamente documentados pelas pesquisas realizadas na altura, tornando-os factos indesmentíveis.

II

CONVENTO DA ARRÁBIDA



O Convento da Arrábida foi fundado sob a égide dos duques de Aveiro, do qual exerceram o padroado. D. João de Lencastre, homem muito afeito às coisas de Deus, sempre teve em mente instalar uma comunidade religiosa na encosta marítima da Serra da Arrábida, por pensar ser um local adequado e também ao mesmo tempo para poder afirmar que esta era parte integrante dos seus domínios.
Numa sua deslocação a Espanha a fim de visitar os condes de Santo Esteban del Puerto, retribuindo uma cortesia” em cuja estadia previa uma ida ao Santuário de Nossa Senhora de Guadalupe, onde os duques entabularam conversações com um filho do conde, Frei Martinho de Navarro pertencente à Ordem de S. Francisco. Este manifestou aos duques o desejo de fazer vida eremita e eles ofereceram-lhe a Serra da Arrábida. Assim tomou volume o projecto da construção do convento, pelo que Frei Martinho acompanhou os duques quando estes regressaram a Portugal. Sob as directrizes do duque, estabeleceu-se na Arrábida, começando a dar corpo à construção das instalações do convento no local que para efeito já tinha sido escolhido, acção precedida duma grande sensibilização dos residentes das proximidades, porque sem a população ganha para efeito, jamais seria construído o convento.
Frei Martinho adoeceu, por não suportar a aspereza da tarefa, sendo forçado a regressar a Espanha.
Foi substituído pelos frades Pedro de Alcântara e Francisco Pedraíta, também espanhóis, que criaram as condições indispensáveis para os religiosos se instalarem.
 Num plano inferior aos pontos mais altos da serra começaram a ser construídas as celas dos eremitas (os eleitos) para ai viverem afastados de tudo e de todos, alheios às primeiras necessidades, dedicados apenas à contemplação e à penitência.


O convento foi circundado por uma cerca como protecção, assim como lá no alto as celas dos frades eremitas também foram flanqueadas por um muro passando este recinto a ser conhecido por convento velho.
E para assinalar, e não fugir aos costumes, e seguir a tradição, os pontos altos sobranceiros ao convento foram encimados por cruzes, para que de longe os homens tomassem conhecimento de que aquele local era sagrado, dedicado à edificação de Deus.
(Continua)
   
                                                               Henrique Mateus