A direcção do Núcleo de Poesia de Setúbal dispôs-se, desde que tomou
posse, a apostar na renovação. O nosso blogue congratula-se por publicar
hoje a primeira colaboração juvenil. A Ana tem agora 16 anos e é neta do
Henrique Mateus.
.
Como se vê pelo texto dorido, tem asas para voar alto.
posse, a apostar na renovação. O nosso blogue congratula-se por publicar
hoje a primeira colaboração juvenil. A Ana tem agora 16 anos e é neta do
Henrique Mateus.
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Como se vê pelo texto dorido, tem asas para voar alto.
AQUELE DIA
Já passou muito tempo desde aquele dia.
Não sei se algo se alterou no mundo, se as ações da PT renderam mais que o habitual, se a divida da Grécia aumentou, ou mesmo se algum povo se manifestou contra o governo do seu país. Sei, porém, o que mudou no meu mundo.
Já passou muito tempo desde aquele dia e ainda hoje consigo sentir o que senti. Porque foi, até à data, o dia mais triste da minha vida. Faltavam uns minutos para o dia acabar quando o dia acabou para mim; ou melhor, quando acabou para a minha família.
Há mais de dois anos chorei como nunca o fiz em toda a minha (curta) existência. Foi um dia que desbotou o meu mundo; que mudou a perspetiva que eu tinha da vida e me fez refletir sobre o que, de facto, é o mais importante para mim.
Não considero que perdi essa pessoa, pois, no meu coração, continua mais viva que nunca. Não tenho muito a que me agarrar quando a saudade aperta… Sei que as recordações são tudo o que me resta de um convívio de catorze anos.
Dói saber que nunca mais vou poder ter essa pessoa nos meus braços. A vida é insignificante; em segundos leva-nos as pessoas que mais gostamos em troca de nada. De repente desaparecem e não há nada que possamos fazer para o alterar.
Desde aquele dia, uma das casas em que mais fui feliz ficou vazia, tal como parte do meu coração. Não será este o propósito da vida? Irmo-nos esvaziando ao longo dos anos para depois, quando nos tornarmos suficientemente insignificantes, sermos reduzirmos a nada? Nunca mais voltei àquela casa, porque só faz sentido lá ir se estiver lá alguém para me receber.
Nesse dia perdi muita coisa, e só uns meses mais tarde é que percebi que, apesar de tudo, tinha ganho algo. Ganhei uma estrela, a mais brilhante de todo o céu. Mesmo que não a consiga ver todos os dias, sei que estará sempre lá a olhar por todos aqueles que fizeram parte da sua vida.
Ana Cunha
31/10/2012
MÚSICA
Deixamos aqui um fado-canção de Joaquim Marrafa, com letra e música.
Setúbal; quero-te bem,
Te escolhi por adopção,
E trago-te no peito,
Bem junto ao coração!
De Grândola, natural,
Por isso sou grandolense,
Mas como setubalense,
Me julgo por igual!
É neste jardim ideal,
Onde o Sado se detém,
E para onde vim também,
Na casa dos vinte anos,
Sem quaisquer desenganos,
Setúbal; quero-te bem!
Já eras grande outrora,
Uma cidade imponente,
Mas comparativamente,
És mais importante agora.
Em cada minuto ou hora,
Progrides em expansão,
Com industrialização,
E comércio que não para,
Por seres jóia tão rara,
Te escolhi por adopção!
Sem me veres crescer,
Me acolheste, todavia,
Muito ingrato seria,
Eu não o reconhecer.
Estou te a agradecer,
Pelo que me tens feito,
Render-te justo preito,
Dizer quanto te venero,
Teu filho me considero,
E que te trago no peito!
Nos braços me apertaste,
Me renovaste a esperança,
Serei digno da confiança,
Que em mim depositaste.
Nunca me rejeitaste,
Nem invocaste razão,
E é com toda a gratidão,
Que agradeço o empenho,
E afirmar que te tenho
Bem junto ao coração!
Luís Francisco
Chainho
UMA FLOR NA TUA MÃO
Uma flor na tua mão
Uma flor na lapela
Não há coisa mais bela
Não há rosa, sem senão.
Rosas, flores, jardins, pardais
Suspiros, pios e ais
Alegrias, tristezas
Crianças, purezas, que mais?
Uma flor na tua mão
Uma rosa por abrir
Só uma rosa em botão
Uma flor na tua mão
Uma criança a sorrir
E um pobre que pede pão.
Maria Dores Amado
MISÉRIAS
Sou rico e saudável
Porque tenho casa e pão
E a minha mente é estável,
Sem excesso de ambição.
Visto de roupa barata,
Ando de bicicleta,
Gosto de arroz e batata
E acho a moda uma treta...
Dos vícios escravizantes
Fujo eu a sete pés,
Nada de anabolizantes,
Tabaco, vinho ou cafés.
Gosto muito da leitura,
Mas entre o baixo custo
Há matéria com fartura,
E até sem gastar um tusto...
Na NET há freeware
Melhor que programas caros,
Porque hei-de então eu prover
Os banquetes dos avaros?...
Há aí muita miséria
Cuja perceção é lógica,
Mas também é chaga séria
A pobreza psicológica!
Francisco Pratas
ALMA DE OUTONO
Alma de outono traz razão
transmite
nobres segredos;
faz
ouvir novo perdão
na vontade...sem enredos!
Com árvores desnudadas,
campos cobertos de folhagem;
as paisagens envergonhadas
pelo trepidar da aragem.
O sol espreita...de
sentinela
as aves, no chilrear!
Seguem rota por viela,
vão em bando patrulhar.
Passam leves, deixam pena
que cai sobre uma planta;
esvoaçam com vida amena,
seu cantar tanto encanta.
A terra é embalada
com as águas da cascata;
de aroma é perfumada
do belo que dali dilata.
A Natureza nunca dorme
...oculta o soluçar!
Dá abrigo e mata a fome,
vai renovando o Criar.
Inácio J. M. Lagarto
SETÚBAL ANTIGA
A gravura mostra um dos arcos do aqueduto, já derrubado. Era
possível avistar o castelo de Palmela
e as traseiras do Convento de Jesus.
Desconheço o nome do autor e a data do desenho .
FREI AGOSTINHO DA CRUZ
I
SERRA DA ARRÁBIDA
Ao escrever sobre Frei Agostinho da Cruz,
forçosamente tenho de escrever sobre a serra da Arrábida, a sua montanha
sagrada como a considerava, e principalmente sobre o seu convento, como este
surgiu e porque surgiu ali. Não é por acaso que este conjunto de edifícios
religiosos se encontra a meio da encosta, nem muito perto, nem muito longe do
mar. Certamente que sobre a escolha daquele ponto, teve influencia os
frequentes ataques dos piratas magrebinos, independentemente de outros. É um
lugar paradisíaco por excelência, de micro clima ameno, vegetação luxuriante e
com protecção completa dos ventos, além existir água de nascente suficiente
para manter o empreendimento.
O alto da serra também não seria o local
indicado, porque desde os primórdios da humanidade que há um certo respeito e
admiração pelo alto dos montes por estes estarem mais perto das estrelas e
segundo a superstição de aí ser a morada dos Deuses, sempre foi assim e hoje
continua a ser a prática de todas as religiões: – Comparar os porquês? A
mitologia grega faz referências ao monte do Olimpo o seu local sagrado. A
Bíblia também nos fala do monte de Ararat onde encalhou a arca de Noé, assim
como o monte do Sião e o Monte do Templo, como nos fala também do Monte das
Oliveiras onde Jesus pregou, qualquer destes não distantes da cidade velha de
Jerusalém. Aliás, na Bíblia fazem-se muitas referências do género.
Foi aqui segundo consta, que em tempos
remotos foi construída a capela de Nossa Senhora da Arrábida.
Também se fala de, no local, ter existido
uma Ermida da Memória. Não será que as duas são a mesma coisa?
Não há vestígios conhecidos que sirvam de
referência para se poder afirmar que existiram as duas capelas. Parece poder-se
afirmar que uma ermida existiu; a época da sua construção não é conhecida, mas
quando foi construída é porque nas proximidades residiria muita gente, porque
só assim se justificava a sua construção. Sabe-se que no Portinho sempre
residiu uma comunidade de pescadores. Também se sabe que no Creiro, houve em
tempos mais distantes um núcleo populacional romano, assim como no sítio onde
hoje se situa a Torre do Outão, que foi conhecido por promontório de Neptuno, e
onde existiu um templo dedicado a esta divindade, cuja estátua em bronze de tamanho
normal foi encontrada “e lamentavelmente utilizada na fundição dos canhões da
fortaleza “e, também diversos artefactos que no acto dos achados foram
distribuídos por alguns nobres coleccionadores. Hoje restam apenas os vestígios
arqueológicos que estão lá e largamente documentados pelas pesquisas realizadas
na altura, tornando-os factos indesmentíveis.
II
CONVENTO DA ARRÁBIDA
O Convento da Arrábida foi fundado
sob a égide dos duques de Aveiro, do qual exerceram o padroado. D. João de
Lencastre, homem muito afeito às coisas de Deus, sempre teve em mente instalar
uma comunidade religiosa na encosta marítima da Serra da Arrábida, por pensar
ser um local adequado e também ao mesmo tempo para poder afirmar que esta era
parte integrante dos seus domínios.
Numa sua deslocação a Espanha a fim de visitar
os condes de Santo Esteban del Puerto, “retribuindo uma cortesia” em
cuja estadia previa uma ida ao Santuário de Nossa Senhora de Guadalupe, onde os
duques entabularam conversações com um filho do conde, Frei Martinho de Navarro
pertencente à Ordem de S. Francisco. Este manifestou aos duques o desejo de
fazer vida eremita e eles ofereceram-lhe a Serra da Arrábida. Assim tomou
volume o projecto da construção do convento, pelo que Frei Martinho acompanhou
os duques quando estes regressaram a Portugal. Sob as directrizes do duque,
estabeleceu-se na Arrábida, começando a dar corpo à construção das instalações
do convento no local que para efeito já tinha sido escolhido, acção precedida
duma grande sensibilização dos residentes das proximidades, porque sem a
população ganha para efeito, jamais seria construído o convento.
Frei Martinho adoeceu, por não suportar a
aspereza da tarefa, sendo forçado a regressar a Espanha.
Foi substituído pelos frades Pedro de Alcântara
e Francisco Pedraíta, também espanhóis, que criaram as condições indispensáveis
para os religiosos se instalarem.
Num
plano inferior aos pontos mais altos da serra começaram a ser construídas as
celas dos eremitas (os eleitos) para ai viverem afastados de tudo e
de todos, alheios às primeiras necessidades, dedicados apenas à contemplação e
à penitência.
O convento foi circundado por uma cerca
como protecção, assim como lá no alto as celas dos frades eremitas também foram
flanqueadas por um muro “passando este recinto a ser conhecido por
convento velho“.
E para assinalar, e não fugir aos costumes,
e seguir a tradição, os pontos altos sobranceiros ao convento foram encimados
por cruzes, para que de longe os homens tomassem conhecimento de que aquele
local era sagrado, dedicado à edificação de Deus.
(Continua)
Henrique Mateus
(Continua)
Henrique Mateus